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segunda-feira, 21 de agosto de 2017

"Viver"

Joaquim Rodrigues

Nunca senti vergonha de amar alguém, os sentimentos que eu sempre expus, foram sempre verdadeiros, naturais e justos. Todos nós na nossa vida amamos sempre alguém, mas como tudo na vida acaba?
Acaba porque talvez seja um amor daqueles amores descartáveis, talvez seja porque como todos nós estamos marchando em bando para esse precipício sem fundo, que é transformar o afecto em satisfação do ego.
E lá vamos nós, galopando, sedentos e tropeçantes, lá vamos nós, reduzindo o amor à citação da frase bonita nas redes sociais, lá vamos nós, reduzindo o amor a uma selfs bonita, mesmo distante, superficial e irreal.
Todos nós fazemos promessas que nunca vamos cumprir! Damos a mão ao desconhecido jurando ser um velho amigo, esquecemos, no entanto, das lacunas individuais do outro. Esquecemos das rachaduras que há, no eu, que se transporta para você e para os nós, fingimos que o outro não está ali, porque o importante é a nossa projecção ficar intacta, no nosso ego, e se prejudicamos o outro, passa a ser um problema dele, desde que estejamos bem connosco mesmo.
Ai! …O amor dos sonhos. O amor desenhado e pré concebido. O amor e seu passo em falso, o amor do sorriso aberto no canto da boca, fazendo uma fenda, tudo isso é inabalável até o primeiro estalo, até o mirado no tecto de olhar triste, até o desmoronamento até virarmos ameaça, é ai que a gente pula do barco antes que este se afunde, não existe bote preferencial, é cada um por si, e Deus por todos.
É aí que deixa de haver marinheiro, quem mais acreditou que se lasquem, a falácia não se sustenta, o amor coisa nenhuma, e sim vaidade, o amor coisa nenhuma, e sim um passatempo, o amor coisa nenhuma, e sim, uma droga alucinogénia da sua própria e única felicidade, e assim acaba o efeito, a ressaca, acaba a droga da imaginação do amor, o amor? Vamos é negociar como o fazem os traficantes.
O amor entorpecente, com mais ressaca, com mais vício, até ficarmos todos irreconhecíveis, revirando qualquer lixo para uma refeição saudável, somos óptimos teóricos, mas não somos pragmáticos, tentamos ensinar é ao outro aquilo que que não sabemos, e muitas das vezes a quem mais sabe do que nós sabemos. Somos Ph.D. em teorização socrática do amor, mas desarmamos logo tudo na primeira questão que aparece.
Culpamos sempre Deus, por tudo que fazemos, culpamos nosso modelo económico, culpamos a sociedade, e esquecemos que a sociedade somos nós mesmo.
Suplicamos, mais amor, “por favor”, mas não temos nada a oferecer, a não ser uma noite vazia, uma estação do ano, uma garrafa de vinho barato.
Se o outro não está mais para servir a bomba de endorfina, descartamo-nos dele. Fazemos dos nossos parceiros traficantes do bem-estar, afinal, para que serve um garçom com a bandeja sem nada, vazia?
Vamos é chamar outro, e outro, e outro, até encontrar quem nos sirva, morrer pobre não está no nosso sonho, não vamos é fechar o bar, sem encontrar nada, e acabar caídos na calçada praguejando Deus ou a pouca sorte ao infinito, só porque não somos capaz de reconhecer quando erramos.
É verdade que já estamos em outros tempos, que a idade já não nos ajuda a convencer ninguém, mas deixar de tentar não se ganha nada.
Também é verdade que quase ninguém leva a sério a promessa, (de que nos vamos amar até que a morte nos separe?), e talvez seja mais saudável assim.
As relações acabam, a vida é um rio com várias fluentes, que nem sempre corre para o mesmo lado, tem sempre quem mude o seu trajecto, o trajecto muda, mas o rio segue a sua viagem, o problema é quando achamos que no mundo, a definição do amor ideal é só para satisfazer nossos desejos, e viver nossos sonhos, o problema é quando perdemos a noção do sagrado, mentimos com todos os dentes que temos na boca, e conseguimos convencer o mundo, (só o mundo que nos é igual pois é claro), e compramos todo o tempo do profano.
E assim, as juras dão lugar ao silêncio, e ao sentimento não correspondido em uma via de mão única, basta rasgar umas fotos do outro, virar as costas ao outro, que o outro logo deixa de existir.
E vamos repetindo sempre os mesmos erros, e vamos seguindo todos, nessa marcha fúnebre, que é a dor do amor morrido, podemos saber que não nos fizeram juras eternas, podemos saber que ninguém pode prometer nada, mas quem vive com o amor, acredita que fosse verdade, mas nada foi feito para durar.
Mas nunca podemos é, sentir vergonha de amar, a vida é constituída com amor, sem amor não existe vida, o amor-próprio, e o amor ao próximo também.

(21/08/2017)
Joaquim Rodrigues

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