Joaquim Rodrigues
Entra pela madrugada ocupado com questões práticas,
arrumações de ultima hora, riscando um a um os artigos de uma lista de coisas
que não quer esquecer. Quando se dá por satisfeito, vai tomar um duche demorado
com um sorriso nos lábios. É bom saber que tem tudo pronto, pois fá-lo
sentir-se preparado. Deita-se tarde. É a última noite nesta casa, nesta cidade.
Deita-se cansado mas demasiado excitado para adormecer, de maneira que vai até
de manhã a sonhar acordado com a vida que tem pela frente e só cai no sono
quase à hora do despertador anunciar a hora marcada. Acorda ensonado e com o
mesmo cansaço pendente da noite passada, mas encorajado pela promessa da
novidade.
Olha para trás antes de fechar a porta de casa,
observando os requisitos dos últimos anos, os móveis, os quadros, tudo aquilo
que lhe fez parece ter sido uma vida inteira, um lugar onde se sentia seguro.
Deixa escapar um suspiro, abana a cabeça como quem se questiona o que é que eu
vou fazer, faz um sorriso desafiador, fecha a porta, roda a chave e parte.
Atravessa o Oceano a dormitar com a cabeça apoiada do
braço, à janela, enquanto o Avião avança. Mais para o fim da viagem já está bem
desperto e nervoso, numa ânsia de expectativa. Quanto mais perto do destino
mais se pergunta se não terá cometido um erro, se não terá precipitado, se não
voltará a falhar, se, se, se.
Desce do Avião com um saco, e procura a mala, avança cansado
a custo ao longo do cais, lutando com a própria bagagem, tropeçando nela, sem
saber se é isso que o irrita se é o receio que o enerva. Mas depois avista-a lá
ao longe no fim do cais e ela avança para ele sorridente e, quando se
encontram, abraça-a, beija-a e ela diz-lhe que bom estar aqui finalmente, e
nesse instante, todos os receios, duvidas, nervos se dissipam num encantamento,
numa certeza de que tomou a decisão correcta.
(09/07/2012)
Joaquim Rodrigues