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quarta-feira, 4 de setembro de 2013

"A ternura dos Quarenta" (HD) Joaquim Rodrigues


"És tu que Controlas"

(Joaquim Rodrigues)

 
É da tua cabeça!
O cinzento não é cor.
O frio, não é frio.
E a chuva molha parvos.
O conformismo não tem de ser.
O pessimismo é para meninos.
E o difícil depende do ponto de vista.
Resiste.
Não te deixes cair.
Tu controlas.
(Anda, és tu que controlas)
Sabes?
A tua cabeça comanda o teu corpo.
E o teu corpo ainda é calor.
Alimenta-o e faz-te há luz.
Pratica a fotossíntese.
Mostra o teu lado solar.
E mete-o em look.
Lá por estar a chover.
Não tens de baixar a cabeça.
Sem lamúrias.
Não pares, insiste!
Mostra-lhe o moral com que vens.
Um direto de esquerda.
E acabará por ir ao tapete.
Ele não é mais forte que tu.
O Inverno é psicológico.
(03/09/2013)
Joaquim Rodrigues


"Ni he Olvidar" (HD) Joaquim Rodrigues


" Uma conversa Casual"


 O rapazinho, sentado num banco público, num jardim com vista panorâmica sobre a cidade, come um gelado ao lado do pai.
- Porque é que te foste embora? Pergunta, entre duas lambidelas no gelado.
O pai volta a cabeça para o observar. A pergunta foi feita num tom casual, como se não tivesse importância, mas apanhou-o de surpresa, deixou-o em alerta.
- Não me fui embora, responde-lhe, estou aqui contigo, não estou?
- Estás, mas já não dormes lá em casa.
- Porque agora tenho outra casa, que também é tua.
- Porque é que tens outra casa?
- Porque eu e a mãe decidimos viver assim. Às vezes, os casais preferem separar-se e ficar cada um na sua casa.
O miúdo cai em silêncio, por momentos, a absorver esta informação, enquanto continua a comer o gelado. Tem a boca suja como se a tivesse pintado de vermelho. O pai limpa-a com um guardanapo de papel.
- E vocês nunca mais vão voltar a viver juntos?
- Não, vamos viver cada um na sua casa.
- Hum, está bem. Sabes, tenho um amigo na escola que os pais dele também vivem cada um na sua casa. E ele diz que os pais discutiam muito, antes de se separarem, como vocês.
- Nós não vamos discutir mais, diz o pai.

(Joaquim Rodrigues)
 Sente uma súbita necessidade de fumar, leva a mão ao bolso, mas não quer fazê-lo à frente do filho e reprime o gesto. A criança continua a falar no mesmo tom inocente, casual, mas cada frase, cada dúvida, é como uma seta ao coração do pai, gela-lhe o sangue.
- Já não gostas da mãe?
- Gosto, mas é diferente, já não quero viver com ela e ela também já não quer viver comigo.
- E eu vou viver com quem?
- Com os dois. Uns dias ficas com a mãe, noutros comigo.
- Era mais fácil se não discutissem mais e continuassem a viver juntos, comigo.
- Assim também vai ser bom, vais ver. Terás dois quartos, vais gostar.
O filho acaba de comer o gelado. O pai volta a limpar-lhe a boca.
- Quando eu for grande e casar, não vou separar-me nunca, declara, determinado.
Nesse momento, ele vê-a ao fundo do jardim, a aproximar-se. Aponta na sua direção.
- Olha quem vem ali, diz. O miúdo reconhece a mãe, corre para ela, abraçam-se.
 Vai ao encontro deles, troca umas palavras amigáveis com ela, despede-se do filho, fica a observá-los a afastarem-se. Acende então o cigarro proibido, torna a sentar-se no banco, a recapitular a conversa com o filho, a analisar a sua vida, o que fez mal, o mal que terá feito à criança, ainda que involuntariamente. Mãe e filho desaparecem do seu campo de visão e ele sente um vazio. Sabe que não haverá um recuo, não voltará atrás, mas, nesse instante, tem a sensação de ter ficado sozinho no mundo.

(01/09/2013)
Joaquim Rodrigues