Joaquim Rodrigues
Há muito tempo, ela tem um segredo que não lhe conta.
Porém, esse segredo impede-a de continuar com ele e, assim, contra toda a
certeza do seu instinto, manda-o embora da sua vida com a alma num pranto, sem
um pingo de piedade, sem um sinal de compaixão. Diz-lhe simplesmente que não o
quer mais ver, que não o ama, que a deixe em paz de uma vez. E isso ofende-o
com a insensibilidade que desmente os seus verdadeiros sentimentos, contraria
tudo o que ela o deixou pensar durante todo tempo que namoraram um total
arrebatamento, vira costas e afasta-se dele sem que ele entenda o que se está a
passar, ela entra no comboio que a levará a casa, senta-se à janela com uma
primeira lágrima a escorrer-lhe pelo rosto.
Ele fica ali parado no início do cais, incrédulo, a vê-la
subir para a carruagem. E ela não se atreve sequer a espreitar por cima do
ombro, receando não se conter e saltar do comboio e correr para os seus braços.
Ele espera pelos primeiros solavancos tímidos dos vagões, enfia as mãos
resignadas nos bolsos do casaco e retira-se, enfim, indo em direcção à saída da
estação.
Ela tem algumas horas de viagem para se recompor, limpa
os olhos marejados de uma mágoa surpreendente. Pergunta-se como foi possível
apaixonar-se em cinco dias. Era só uma semana de trabalho bastante atarefada,
reuniões e debates num agradável hotel à beira-mar. Sabe que foi irresponsável,
que se deixou ir sem pensar. Sabe que não devia ter dado aquele passeio pela
praia, que não devia ter ficado a conversar com ele à lareira, na sala, nem,
finalmente, ter subido ao quarto na sua companhia.
Pensa no marido, na filha pequena, diz a si própria que
tudo não passou de um desvario, de um deslize que vai calar fundo e jamais se
repetirá. Sente-se aliviada por não lhe ter contado que era casada e por não
lhe ter dado nenhum contacto pessoal. Procura convencer-se de que voltará à sua
rotina normal e esquecer. No entanto, já vai no fim da viagem e continua a não
encontrar uma explicação razoável para o sentimento tão forte que teve por ele,
que tem, como nunca teve por ninguém. Não o verá mais, supõe, fora de questão,
não pode, mas parece-lhe tremendamente injusto que seja assim.
Dois anos depois, ele fuma um cigarro sentado na
explanada do costume com vistas para o Mar. É um dia de Outono um pouco
cinzento, são muitos os dias que ele gosta de sentar ali apreciando os sons
característicos e exuberantes, que as ondas do mar fazem ao bater nas rochas, o
mar lhe dá a paz que precisa.
Ela hoje é uma mulher divorciada seu casamento nunca mais
foi o mesmo desde que eles se deixaram de ver. Foram muitas as vezes que pensou
nele que o procurou, mas nunca o encontrou, desistiu.
Nas suas costas ele ouve vozes femininas, pessoas que
acabam de chegar ao bar, mas não dá importância, contínua com olhar profundo a
fumar o seu cigarro a imaginar como é sobrenatural a força que o mar tem.
Ela depois de sentada com a sua melhor amiga muda de cor
como quem desfalece, amiga preocupada pergunta.
- Estás bem?
Ela abana a cabeça afirmativa, mas a emoção a faz passar
a mão na cara para limpar a lágrima que escorre no seu rosto, amiga volta a
perguntar.
- Então? O que se
passa contigo? Queres ir embora?
Ele ao ouvir a conversa das suas vizinhas de esplanada
deixa por minutos de olhar o mar e volta-se para trás. E quando os seus olhos
se encontram, ficam ali se olhando por segundos sem forças, sem palavras,
frente a frente, olhos, nos olhos.
- Ok, já percebi tudo, responde amiga.
(13/10/2013
(Joaquim Rodrigues)
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