Joaquim Rodrigues
A um sábado há tarde eles os dois entram no supermercado
vai às compras, são um casal vulgar, na casa dos sessenta, daqueles que ninguém
repara duas vezes, quando cruzam com eles. Ele veste um fato cinza escuro,
gasto, de má qualidade, e usa gravata apesar de ser fim-de-semana. Ela traz um
dos seus eternos vestidos leves de Verão, floridos, que dão a impressão de
serem todos iguais e todos igualmente banais.
Demoram-se cerca de uma hora pelos corredores do
supermercado. Escolhem criteriosamente os produtos que compram, e trocam uma ou
duas palavras sobre a marca dos cereais ou do azeite e, estando os dois de
acordo, colocam-nos no carrinho. Nenhum deles toma uma decisão autónoma e faz
uma compra por impulso. Tudo o que levam obedece à regra do consenso. Dir-se-á
que é uma negociação inútil, visto que no final levam exactamente as mesmas
compras de sempre, mas trata-se de um ritual antigo que lhes dá prazer cumprir.
Colocam os produtos no tapete rolante da caixa, onde a
empregada jovem vai passando com eficiente indiferença as embalagens pela
máquina que lê o código de barras. A rapariga não abre a boca, senão para lhes
perguntar se querem sacos e para os informar do total da conta. E muito se
poderia dizer sobre uma pessoa pelas compras que faz. Mas ela só está
interessada em verificar quanto tempo falta para acabar o turno.
Ele enche dois sacos de plástico enquanto ela atrapalha a
fila de clientes ao apresentar um maço de papéis de desconto que obriga a
empregada a verificar antes de fazer a conta. Depois, tira uma nota da carteira
e alguns trocos do porta-moedas. Saem do supermercado, atravessam a rua,
colocam os sacos no porta-bagagens do carro, voltam a trancá-lo, dirigem-se
para a pastelaria ali mesmo em frente, sentam-se na esplanada. Pedem dois cafés
e dois pastéis de nata. E, se não pedissem, o empregado saberia o que lhes deveria
trazer, pois vão lá há anos e, que ele se lembre, nunca fizeram um pedido
diferente.
Não conversam muito, mas há uma ternura óbvia na forma
como comunicam com um olhar cúmplice ou um gesto atencioso. Demoram-se ali
cerca de meia hora. Há sempre uma ou outra pessoa que entra ou sai da
pastelaria e que os cumprimenta educadamente, gente conhecida do bairro, só
isso. Eles não têm propriamente amigos, nem filhos, nem sequer família
afastada. Vivem um para o outro com uma dedicação pacífica, muito agarrados às
rotinas quotidianas. Houve um tempo em que pensaram em viajar um pouco, depois
de se reformarem, mas, chegada a altura, acabaram por desistir da ideia. São um
casal sem ideias. Ainda assim, são felizes à sua maneira, enfim, moderadamente
felizes, como tudo na vida deles.
(18/07/2014)
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