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terça-feira, 29 de agosto de 2017

"Amar como é?

Joaquim Rodrigues

 Quando de início começa é fácil, mas acabar é mais fácil ainda, chega-se sempre à primeira frase, ao primeiro abraço, aquele gostoso beijo que nos marca para o resto do dia, ao primeiro mês de amor, cada começo é uma mudança, e o coração humano vicia-se. Vicia-se de tudo, da novidade, e do jeito do outro, do sentir que não estamos sós, do carinho de uma mão que nos afaga o rosto, do calor de um corpo deitado a nosso lado na cama, é uma rotina a que todos nos habituamos facilmente. No início é assim, de uma página branca onde nada ainda está escrito, até há luz do barulho das portas que se abrem e fecham. Todos nós somos assim, uns viciados.
Começar é fácil, acabar é mais fácil ainda, é por isso que respeito cada vez menos todas estas ginásticas que todos nós fazemos para amar alguém. São actividades que aprendi que o mais natural é criar, e o mais difícil de tudo é continuar. Mas confesso que mesmo sendo assim, actividade que eu mais amo e respeito, é a actividade de manter.
Quase tudo se resume a começos e a encerramentos. Arranca-se com um relacionamento de qualquer maneira, cria-se fortes expectativas enganamos o nosso coração, é como que dizer, encontramos o teu alimento saudável meu amigo. Mas há mínima comichão! Coração aguenta mais uma vez por favor, não tem seguimento ou perseverança esse amor, cai no esquecimento e nem damos pela morte dele. É por isso que eu hoje respeito mais os continuadores que os criadores. Criadores não nos faltam, existe é quem inventa tudo, são mandões de sentimentos, fazem juras sem fim “ Este amor é até que a morte nos separe” mas nunca é assim, são heróis do tempo, mas o que eles não sabem, é cuidar do seu próprio coração. Faltam-nos é guardiões a quem chamamos de anjos, para que possam cuidar de nós como deve ser.
A manutenção do amor exige um cuidado maior, porque qualquer trouxa como eu, se apaixona, sem pensar no que pode acontecer amanhã. Embora seja preciso ter paciência para fazer perdurar uma paixão, e o esforço para no tempo o fazer continuar, todas as coisas que se julgam boas, sejam amores ou tradições, monumentos ou amizades, é o que distingue os seres humanos. O nascimento e a morte não têm valor, são os fados da animalidade, procriar é bom, mas o que é lindo é educar.
Hoje já percebo a razão por que qualquer casamento duradoiro é mais apaixonante do que a mais acesa das paixões, guardar é um trabalho custoso, as coisas têm uma tendência horrível para morrer. Salvá-las desse destino é a coisa mais bonita que se pode fazer, mas dá muito trabalho. Mas haverá verbo mais bonito do que «salvaguardar»?
É fácil uma pessoa bater com a porta na cara, zangar-se e ir embora. O que é difícil é ficar. Isto foi o que eu aprendi com ela, ensinou-me porque era o amor da minha vida, era a mulher que eu desejei pra sempre um dia só pra mim. mas ela não me aceitou como eu sou, sou um conservador. É por esta e por outras, que eu hoje vejo melhor a vida, e lhe dedico este meu texto, que eu escrevi à sombra dela.
Preservar como o faço, é defender a minha alma do ataque da matéria e da animalidade. Eu sou assim, nunca deixo sozinhas, as coisas que amarelecem, apodrecem e morrem. Não há nada mais fácil do que esquecer o que não existe. Pior é se ainda existe, sentimo-nos mal, e começar do zero, ao contrário do que sempre pretenderam todos, já não é assim tão fácil. O mundo é gratuito. Faz com que não seja preciso estudar, aprender, respeitar, absorver, continuar, mas amar fazemos sempre o mais difícil, amar como é?
(29/08/2017)
Joaquim Rodrigues

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