Há uns meses atrás, um certo dia, ela pediu-lhe que escrevesse uma história onde ela se podesse ver nela, a sua história. Ele no momento logo pensou que talvez ela o estivesse obrigar a escrever a história mais difícil que até ali conseguiu escrever, e se a vida dela, dava uma história de vida, ela não prometeu narrar a mesma, de maneira que o desafio é escrever uma história a partir do nada, de um ecrã de computador em branco, sem qualquer ideia senão as palavras dela a ressoarem no seu pensamento.
- Escreve-me uma história.
Ele coça a cabeça, embaraçado. Está no emprego, a roubar tempo ao trabalho e a pensar.
“Por que raio é que ela me pede que lhe escreva uma história se não sou escritor e não escrevo nada de jeito?”
Ele não quer dar-se como derrotado, mas, ao fim de uma hora sentado ao computador, começa a sentir-se desesperado, sem uma ideia decente. E, no entanto, mantém-se determinado em escrever algo que a faça feliz. Então, lembra-se que pode comprar-lhe um ramo de flores e escrever-lhe umas palavras bonitas num cartão. Não será a história que lhe pediu, mas espera compensar a sua incapacidade com as flores.
Olha para o relógio, o dia está a acabar e verifica que tem pouco tempo antes de a florista fechar. Agarra no casaco e vai-se embora, com pressa, antes da hora de saída. Quando chega, a porta já está fechada. Espreita pelo vidro, não vê a florista, mas há um rapaz a varrer a loja. Bate no vidro, o rapaz apoia-se indolentemente na vassoura, faz-lhe sinal de que já fecharam, recomeça a varrer.
Volta a bater, o rapaz olha para fora, aborrecido, lá se decide a arrastar os pés até à porta, abre. Pede-lhe para lhe vender um ramo de flores. Responde-lhe que só está ali para varrer e não sabe nada de flores. Pensa que também não percebe nada de histórias e tem uma para escrever.
- Vamos improvisar, afirma, acenando-lhe com uma nota de vinte.
O rapaz rola os olhos, contrariado, guarda a nota no bolso, convida-o a entrar.
No autocarro, coloca o ramo de flores no lugar livre ao seu lado e concentra-se no cartão com uma caneta na mão. Um homem, de pé no corredor, desequilibra-se com uma guinada do condutor e aterra em cima do ramo de flores. O homem olha para ele com um sorriso culpado, antes de voltar a levantar-se.
Senta-se num banco público, na rua, desanimado. O ramo de flores arruinado está enfiado no caixote de lixo ali ao lado. Ela está à sua espera para jantar e não tem nada para lhe oferecer. Nem história nem flores. Subitamente, surge-lhe uma ideia e percebe que já tem a sua história!
Quando ela abre a porta oferece-lhe uma garrafa de náufrago com uma folha enrolada no interior. Ela retira a folha e lê a história que ele escreveu e que começa assim.
"As vicissitudes de um pobre apaixonado para agradar, à namorada."
Depois de ler, abraça-se a ele, emocionada.
- É uma história bonita, afirma, melhor do que ficção e melhor do que um ramo de flores.
Ele sorri, aliviado, até ela acrescentar.
- Querido estive a pensar numa coisa.
(09/06/2013)
Joaquim Rodrigues
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