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segunda-feira, 29 de abril de 2013

"Um Caso Inesperado"


Entro na discoteca, está tão cheia, e é difícil uma pessoa movimentar-se entre a multidão alegre que preenche todo o espaço junto ao balcão, entre as mesas, e a pista de dança. Olho ao redor procurando um lugar onde me possa encostar, como não existe, encosto-me a uma coluna a observar o ambiente. Para onde quer que me volte, só vejo pessoas a falar aos gritos, embora não seja possível ouvi-las porque a música alta abafa suas vozes.
Com um copo na mão vou bebericando, enquanto penso que faria melhor se fosse embora, porque já não tenho idade para estar apertado, que nem sardinha enlatada. Olho para o meu lado direito onde existe três mesas e mais atras encostado a uma parede de vidro um maple, ocupado por um casal ainda muito jovem, que de vez em quando, se vai beijando como dois apaixonados.
Mas em uma das mesas baixas, reparo numa mulher sentada a alguns metros mais à minha esquerda, que me sorri. Quando nossos olhos se cruzam, eu devolvo o sorriso. Acho-a muito bonita, e divertida também, pois tem um gesto engraçado, apontando para o banco vazio ao seu lado, convidando-me para me sentar.
  “Deve estar ali, já há muito tempo, a ver a figura que eu tenho andado aqui a fazer com a minha idade, no meio desta juventude, de copo na mão, quem me mandou a mim se meter nesta vida que não é a minha?”- Pensei.
Mas aceitei o convite, afinal era a única maneira de me adaptar ao ambiente, conversar com alguém. Mas depressa os dois percebemos que é difícil manter uma conversa com tanto barulho, de modo que eu recorri a uma caneta que tinha no bolso e a um guardanapo de papel que encontrei em cima da mesa para lhe escrever uma mensagem. Ela entra na brincadeira e responde-me igualmente por escrito. Ficamos assim a saber o nome de cada um e pouco mais, porque ela vai-se logo embora, não volto a vê-la, e deixei então de pensar mais nela.
Estou debruçado sobre o balcão da loja a verificar uma nota de encomenda quando minha irmã entra.
 

Há dois anos que tenho a loja de electrodomésticos no centro comercial e acabei por lhe dar emprego. Dez minutos mais tarde, sai para ir tomar um café. Sento-me a uma mesa a folhear o jornal do dia enquanto espero que o empregado me sirva. Este regressa com o café e com uma mensagem escrita num guardanapo de papel.
- Aquela senhora disse para lhe entregar isto, informa-me.
Ergo meus olhos, e vejo-a a sorrir de longe e reconheço-a da outra noite na discoteca.
- Ainda se lembra de mim? É a pergunta escrita no guardanapo.
- Claro que sim, escrevo em resposta, e vou devolver-lhe pessoalmente o guardanapo.
Sento-me com ela e descubro com espanto que trabalha-mos no mesmo centro comercial, embora nunca nos tivéssemos cruzado.
Os últimos seis meses passaram a correr e, quando ela pensa na sua vida, sente-se encantada com a volta inesperada que esta deu em tão pouco tempo. Deixou o emprego que tinha e veio trabalhar para a minha loja, depois de minha irmã ter decidido montar o seu próprio negócio. Eu hoje chego mais tarde e abraço-a com o mesmo carinho da primeira vez. Ela sorri com cara de caso.
- Que foi? Perguntei.
Ela não responde, mas escreve-me uma mensagem num guardanapo de papel.
- É um hábito só de nós dois, que, por graça, nunca perdermos, diz.
Eu li o que está escrito no guardanapo e encaro-a com os olhos brilhantes.
- A sério?! Hum-hum, diz ela, fazendo que sim com a cabeça.
- Estás de quanto tempo?
- Três meses, meu querido, responde-me.

(28/04/2013)
Joaquim Rodrigues

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