Depois de o comboio partir, de ela ter ido, depois do derradeiro beijo com a máquina já em movimento, ele fica ali, na estação, ainda uma hora, a despedir-se dela, a pensar nela com a saudade deixada a pairar na memória do seu perfume, do último abraço. Fica ali, preso à nostalgia da partida, a tomar um café com o cais de embarque à vista, observando outros casais que se separam com os comboios que seguem viagem e outros que se reúnem com os comboios que chegam. Para trás ficam umas férias encantadas, só os dois, juntos, com aquela sensação feliz de perenidade que perdurou enquanto, nos braços um do outro, garantiam que era para sempre sem se quererem lembrar de que era só por uns dias. Nesse tempo exíguo passearam por muitos lugares, mas faltar-lhes-ia ainda uma vida inteira para continuarem a passear, a visitar todos os recantos de todos os lugares que sonharam ver sem a ansiedade dos dias contados.
Ali sentado na esplanada que dá para o cais da estação, ele dá consigo a recordar-se dos momentos bons que passou com ela, das conversas exclusivas, das mãos dadas ao final da tarde numa praia, de uma piada trocada entre os dois, de uma gargalhada. Lembra-se de cada pormenor do seu corpo, de passar as mãos pelo seu cabelo comprido acabado de lavar, do seu sorriso único, do seu sentido de humor. Revê-se a abrir os olhos e a descobri-la ao seu lado ao despertar da manhã numa cama demasiado pequena para tanto amor.
Um dia, há não muito tempo, ela disse-lhe que não poderiam ficar juntos, que não acabariam um com o outro, pois iam demasiado adiantados na vida e estavam ambos presos às escolhas do passado, mas depois o desejo foi mais forte do que a razão, depois ela não quis saber de nada e veio e, observando agora os namorados que se despedem à porta do comboio, ele pergunta-se quando a voltará a ver e decide que, não obstante as contrariedades que os separam, quer ir ao seu encontro e irá mesmo, inevitavelmente, reencontrá-la em breve.
Acaba o café sem pressa de deixar o lugar onde a viu pela última vez, levanta-se, encaminha-se para o átrio da estação, olha ainda para trás, espreitando por cima do ombro como se fosse possível ela não ter partido e estar ali, algures no cais, à procura dele. Depois vai-se embora, assegurando-se de que tem o telemóvel na mão e de que está ligado. Quando o comboio partiu ele tentou dizer-lhe uma última palavra, uma última recomendação, mas as portas já se tinham fechado e ele deu consigo a pensar o que não lhe conseguiu dizer.
"telefona-me quando lá chegares."
(19/04/2013)
Joaquim Rodrigues
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