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quarta-feira, 27 de março de 2013

"O Amor mora ali ao Lado"



Eles se cruzaram a primeira vez há meses! E aí se passaram a conhecer de vista! Se tinham cruzado um pelo outro, porque viviam no mesmo bairro, e isso se tornava fácil de eles se ver na rua. Mas já se voltaram a cruzar no supermercado, no café, de passearem os cães no jardim. Ela mora dois prédios ao lado do dele, não sabe o seu nome, nem o que faz, mas conhece-lhe algumas rotinas, já ouviu a sua voz, aprecia a forma de ele se vestir. Acha-o atraente e fica atenta quando o vê. Ele gosta de levar um livro consigo quando vai com o cão ao jardim. Senta-se num banco a ler, mas, se ela chega, não consegue concentrar-se. Finge que lê, espreita-a por cima do livro, maravilhado com o seu jeito distraído de caminhar num vaivém constante enquanto fala ao telemóvel, rodando o vestido numa volta graciosa ao fim de alguns passos casuais. Adora o seu sorriso encantador, o modo como inclina a cabeça para trás e lança um risinho espontâneo para o ar a meio da conversa.
É sábado, estão sentados numa esplanada do jardim, ambos sozinhos, em mesas próximas, frente a frente. Ela pede um café, deita o açúcar, mexe-o demoradamente com a colher, distraída a observá-lo a ler o jornal. Fantasia que ele vai erguer os olhos a qualquer instante e surpreendê-la a olhar, que lhe sorri e se levanta para ir à sua mesa apresentar-se. Sorri com a ideia no momento em que ele levanta os olhos do jornal, mas apressa-se a desviar os seus, a virar a cara, com vontade de rir. Ele repara que ela desvia o olhar, volta a página do jornal, baixa os olhos por um segundo e torna a olhar. Ela não se atreve a fitá-lo, concentra-se na chávena de café à sua frente. Ele imagina a ir ter com ela para meter conversa. Por um instante, sente-se tentado, pergunta-se se teria coragem. Porque não?, pensa. Mas então ela chama o empregado para lhe pedir a conta e o momento passa. Ele deixa-se estar sentado e ela vai-se embora.
No domingo cruzam-se no átrio de um cinema. Estão ambos acompanhados, vão a salas diferentes. Sustêm a respiração a escassos metros um do outro, os seus olhos fixam-se num espanto recíproco, num relâmpago eterno, e, pela primeira vez, assumem um reconhecimento mútuo, pois ele sorri-lhe e ela faz-lhe uma vénia ligeira com a cabeça, de um modo divertido. A meio da semana ele vai almoçar com um cliente importante a um restaurante requintado da moda e lá está ela para o receber, sorridente, desinibida, dona de um caderno onde escreve à mão e opõe vistos nos nomes das pessoas que chegam com mesa marcada. É relações públicas e veste-se de forma discretamente elegante, uma camisa preta, uma saia arroxeada de seda.
 - Parece que nos encontramos em todo o lado, comenta ele, encantado por a ver.
Ela ri-se.
 - É o destino, graceja.
Dois dias mais tarde, ele chega ao jardim, solta a trela do cão e este corre para junto do dela. Ele aproxima-se dela, sentada num banco, aponta para o lugar ao seu lado, ela faz-lhe sinal com a mão para que se sente.
 - Agora que já sabe o meu nome, diz ele, gostava de saber o seu.
Ela ri-se, diz como se chama e depois começam a falar com naturalidade, como se conhecessem desde sempre.

(17/03/2013)
Rodrigues Joaquim:

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