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sexta-feira, 8 de março de 2013

"ALGUÉM ESPECIAL"


                                       

 Ela sai do trabalho com pressa e corre para apanhar o autocarro. Quer ir a casa vestir outra roupa, qualquer coisa mais bonita, mais sofisticada. Vai a uma exposição de pintura e está entusiasmada por ter um programa diferente, para variar. Fecha a porta de casa, atira a carteira para cima do sofá, entra no quarto contíguo à sala já a despir-se, abre o armário, escolhe um vestido. Troca de roupa rapidamente e segue para a casa de banho. Pinta levemente os olhos, observa-se ao espelho, satisfeita com o que vê. É bonita, mas está sozinha há algum tempo. Volta a pensar nisso, é um pensamento que não a larga ultimamente. Subitamente, sente-se perdida. Regressa à sala e desaba no sofá. Vasculha a carteira à procura de um cigarro. A sala são vinte metros quadrados, o sofá, a televisão, o armário com alguns livros, nada de especial. O que há de especial na sua vida, pergunta-se. Havia uma pessoa, um homem que amava, mas deixou-o para trás. Era complicado, demasiado complicado, não acreditou que podia ser feliz com ele e agora não é feliz de todo. Deixou-o para trás, ele acabou por desistir dela, as duas coisas, embora, na sua cabeça, não o tenha deixado para trás. Deixa-se cair de costas, quase deitada, com os cotovelos apoiados em cima dos braços do sofá, como uma náufraga no seu próprio sofá, num desconsolo. De repente, já não lhe apetece ir à exposição, já não lhe apetece coisa nenhuma, senão chorar, talvez. Ainda assim, dali a pouco, obriga-se a levantar-se, a recompor-se, a sair de casa. Entra na galeria de arte e descobre quadros enormes num espaço moderno, iluminação forte, um rumor alegre. Respira fundo, avança, junta-se aos amigos e fala a todos com uma alegria que não sente. Diz a todos que está feliz, que é muito feliz. Pensou que se saísse e se divertisse seria suficiente. Mas não é. Ainda assim, está apostada em contrariar a melancolia. Aceita um copo de vinho branco – não gosta de vinho branco, mas e então? –, troca piadas com os amigos, diverte-se! É o que parece. Uma amiga apresenta-lhe um amigo. Ele fica por ali a rondá-la com uma conversa agradável e ela não o rejeita. Mais tarde, o amigo da amiga pede-lhe o número de telefone e ela pensa por que não? Apanha um táxi de volta para casa, encosta a testa ao vidro, uma lágrima solitária desce-lhe pelo rosto. Pensou que pudesse conformar-se... Vai direta para a cama, mas a tristeza espanta-lhe o sono. Desperta num sobressalto às três da manhã. Descobre que tem o telemóvel na mão. Procura o nome dele e escreve uma mensagem:
"Estás aqui?, pergunta".
Segundos depois recebe a resposta:
"Estou, estou sempre aqui".
Ela escreve de volta:
"Eu sei, querido".
E torna a adormecer, agora mais tranquila.

(08/03/2013)
Joaquim Rodrigues

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