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sábado, 30 de março de 2013

"A Mulher e o Tempo"



Ela se vê ao espelho depois do banho com uma expressão de fatalidade no rosto. Passou aquela idade em que não tinha de se preocupar com o corpo. Agora, parece-lhe que já não tem tudo no sítio. Por mais que lute contra os efeitos do tempo, não há forma de se sentir satisfeita, e no entanto os homens continuam a elogiá-la. Só ela sabe como, lentamente, vai deixando de corresponder às suas próprias exigências e tem de se esforçar para aceitar as pequenas transformações que vão surgindo contra a sua vontade. Solta um suspiro silencioso, enrola-se na toalha, seca o cabelo, gasta quase vinte minutos com o secador, olhando-se ao espelho pensativa, deixando a mente vaguear pelas ideias de sempre, devaneando sobre a vida, sobre o que teve, o que tem, o que não tem, o que gosta ria de ter.
 " Já teve filhos, já se divorciou, anda à procura de um novo caminho, de um outro futuro. Sorri ao espelho, um sorriso malandro".
Pensa que já passou por tanto e não se arrepende de nada. Vai para o quarto vestir-se. Abre o armário, escolhe um vestido leve, por estriar, que comprou para este Verão, veste-o, volta ao espelho, observa-se apreciadora, com a cabeça de lado, sente-se satisfeita. Depois gasta mais algum tempo na casa de banho a pintar os olhos, a pôr um pouco de perfume no pescoço, a dar uma derradeira penteadela para soltar o cabelo ao seu gosto. Escolhe uma carteira, transfere para lá a tralha infindável que tem no saco de todos os dias, deixando de parte uma ou outra coisa de que não vai precisar hoje. Anda às voltas pela casa, descalça, à procura de um casaquinho fino preto que não sabe onde guardou. Encontra-o, volta ao quarto e escolhe umas sandálias de fitas que enrola nos tornozelos e prende com um laço. Ainda tem alguns minutos para a hora marcada. Vai ao computador matar esse tempo, no Facebook.
Dali a pouco recebe uma mensagem dele no telemóvel, a dizer que está a chegar. Desliga o computador, apanha a carteira, o casaco, dá uma última olhadela ao espelho da entrada e sai de casa. Quando entra no carro, ele recebe-a de boca aberta com um elogio sincero, diz-lhe.
 - Estás linda.
Ela sorri, feliz com o efeito que provocou nele, mas pensa.
 "Se tu soubesses o trabalho que tenho para ficar assim".
E mais uma vez lembra-se que há uns anos atrás bastava-lhe vestir qualquer coisa rapidamente e o efeito era o mesmo. Mas depois ri para dentro com a ideia de que ainda consegue fazê-lo abrir a boca de espanto quando a vê entrar no carro.

(25/08/2012)
Rodrigues Joaquim:

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